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terça-feira, 25 de agosto de 2020

Desafios e Soluções para uma Instituição de Ensino na Crise da Covid-19.

 FAPEN ON-LINE. Ano 1, Volume 8, Série 25/08, 2020.


Prof. Dr. Carlos Rivera. 

Diretor Geral do Colégio e Faculdade Pentágono de Santo André.

Avaliador de Cursos de Graduação do INEP/MEC.

Membro fundador da Rede Latino Americana de Cooperação Universitária - RLCU.

 

Graduado em Engenharia - UMC.

Especialista em Gestão Universitária - Mackenzie.

Mestre e Doutor em Engenharia - Mackenzie.


Prof. Dr. Roberto Lobo e Silva Filho.

 

Professor Sênior do Instituto de Estudos Avançados da USP.

Diretor do Instituto Lobo.

 

Foi Reitor da Universidade de São Paulo.

 

Graduado em Engenharia Elétrica - PUC/RJ.

Mestre e Doutor em Física pela Purdue University.


RESUMO: Este trabalho analisa as medidas adotadas por uma instituição de ensino básico e superior, cuja gestão decidiu enfrentar os problemas originados pela pandemia do Covid-19 com uma grande mobilização interna, baseada na liderança do Comitê Gestor da Crise e que contou com um apoio de professores e funcionários. Medidas adotadas são relatadas com suas repercussões na vida da Instituição, cujas análises permitiram a montagem de um plano institucional de retomada para os próximos meses.

PALAVRAS-CHAVE: Educação, Pandemia, Gestão de Crise.

 

ABSTRACT: This article analyzes the measures taken by an elementary/high school and higher education institution whose administration decided to face the problems caused by the Covid-19 pandemic with a large internal mobilization based on the leadership of the Crisis Management Committee  which was supported by teachers and staff. The measures adopted are reported with their repercussions on the life of the Institution, whose analysis allowed to establish an institutional recovery plan for the coming months.

KEYWORDS: Education, Pandemic, Crisis Management.

 


1. INTRODUÇÃO.

Instituições de Ensino de todo o mundo passam por um momento delicado, com maior ou menor grau de dificuldade diante da decretação da pandemia do Coronavírus.

Desafiadas por uma situação inesperada, viram-se obrigadas a reorganizar suas operações para enfrentar não apenas os impactos causados pela pandemia, mas, sobretudo, os desdobramentos que surgirão durante o pós-crise.

Este trabalho tem como objetivo específico relatar como uma instituição de ensino, atuante no ensino privado básico e superior, interpretou um cenário crítico, mobilizou suas principais lideranças e conseguiu, de certa forma, otimizar seus recursos durante o enfrentamento dessa crise.

Paralelamente serão apontadas alternativas de soluções para a retomada de suas atividades acadêmicas, paralisadas em razão da Covid19 em 2020.

Pretendemos, com esse relato, contribuir para estudos de casos que envolvam enfrentamento de crises.

A pandemia não será o foco de observação deste relato, mas sim o alto grau de incerteza e singularidade gerado por ela, bem como os eventos indesejados, inesperados e sem precedentes que mexem e geram descrença e angústia com relação ao futuro das instituições.

Portanto, a pandemia gerada pelo Covid-19 será tratada como “crise”.

Embora a palavra crise tenha vários entendimentos, aqui será utilizado o conceito proposto por Rosenthal, Charles e Hart (1989) que define crise como um evento onde há uma ameaça percebida aos valores e funções centrais das organizações e que exige uma resposta imediata.

É exatamente esse o nosso caso, já que, se não tivéssemos respostas rápidas para os problemas que surgissem, a situação poderia desencadear descrenças e incertezas aos corpos docente, discente e técnico administrativo e o risco premente de inviabilidade de nossas atividades.

 

2. A ANÁLISE DA SITUAÇÃO.

O Pentágono é a instituição de ensino objeto desse estudo de caso.

Foi fundada em 1960, na cidade de Santo André, região metropolitana da cidade de São Paulo; atualmente oferece cursos e programas na educação básica e no ensino superior.

A instituição possuía no início do ano, 2.500 estudantes, dos quais 746 frequentam o ensino superior, 123 professores e 69 funcionários técnico-administrativos.

Há alguns anos, a Instituição criou um Comitê Gestor, formado por seus seis diretores e dois membros externos; com o objetivo de pautar decisões e ações das diversas diretorias e auxiliar nas grandes questões da gestão, tendo como princípio fundamental o respeito à missão e aos valores institucionais.

Logo que foi anunciada a interrupção das atividades presenciais em razão da Covid19, a atuação do Comitê Gestor foi ampliada, passando a funcionar como Gabinete de Crise.

Esta ampliação significou uma centralização de todos os dados e informações que chegavam ou saiam da Instituição.

Também houve uma centralização na definição de ações a serem tomadas em função das demandas que surgiam, bem como todo o processo de comunicação com a comunidade acadêmica.

Esta decisão de centralizar acabou configurando um recurso indispensável para o enfrentamento da crise e auxiliando na avaliação de alternativas no período de isolamento.

Algumas instituições concorrentes sinalizaram a antecipação das férias do meio de ano, incentivadas sobretudo pelo Sindicato das Instituições de Ensino, supondo, possivelmente, que esta situação seria resolvida em um curto espaço de tempo.

Internamente, havia uma corrente que defendia esta opção.

Entretanto, a alternativa se mostrou muito simples para uma situação que se vislumbrava como mais complexa, pois foi considerada a possibilidade de que a pandemia pudesse se estender por um tempo maior, podendo fazer haver inclusive perda de vínculo com os estudantes; o que impactaria a Instituição também com provável aumento dos índices de inadimplência, acarretando maior evasão dos alunos.

Caso ocorresse um pico maior de inadimplência, haveria uma situação de comprometimento de fluxo de caixa e dificuldades para cumprir compromissos, inclusive pagamento de salários.

Portanto, a interrupção das atividades acadêmicas se mostrava muito arriscada.

Para um maior entendimento da situação, foi utilizada a análise cruzada do SWOT[i], apoiada pela metodologia do Instituto Lobo de Pesquisa e Gestão Educacional (na qual não há apenas as somas de cada item, mas operações que confrontam numericamente as Forças e Fraquezas com as Oportunidades e Ameaças entre si); pois havia a necessidade de analisar a situação sob a ótica de dois ambientes - internos e externos - para compreender a real situação da Instituição, os meios para o enfrentamento da crise, bem como o estabelecimento de prioridades nas ações, como mostra a Figura 1:

 

Figura 1: Matriz do SWOT com análise cruzada.


Fonte:
 Faculdade Pentágono - FAPEN.


O levantamento das informações para a estruturação da matriz do SWOT contou com a participação dos seis diretores membros que compõe o Comitê Gestor.

Como demonstrado na Figura 1, a equipe de Tecnologia da Informação e Comunicação (TICs) seria nossa grande força para dar o suporte necessário às demandas das coordenações, aliada ao corpo docente, uma vez que toda a operação passaria a ser online por um tempo indeterminado.

Além desta equipe, precisaríamos, mais do que nunca, contar com o comprometimento e cooperação do corpo docente.

Com relação à adaptação dos professores ao ambiente online, tínhamos um certo otimismo, pois vínhamos realizando programas de capacitação com atividades mensais nos últimos 4 anos.

Neste sentido, a crise desencadeou uma forma mais rápida de utilização de metodologias apoiadas em tecnologia da informação discutidas nos treinamentos.

O relacionamento entre professor e estudante apareceu no SWOT como uma força importante, sendo fundamental valorizar e apoiar ainda mais o corpo docente neste momento.

Os pontos que deveriam merecer mais atenção do Comitê Gestor, segundo a matriz SWOT, estariam centrados, de um lado, no tratamento das reclamações e, de outro, na comunicação com os diferentes grupos acadêmicos e técnico-administrativos que compõem a Instituição.

Considerando que a Instituição não dispõe de reservas financeiras para este tipo de situação - segunda maior fraqueza -, a gestão financeira, mais do que nunca, teria um papel fundamental para sustentar as operações e, entre elas, o controle da inadimplência seria fundamental.

No desdobramento da análise da matriz SWOT, obteve-se um posicionamento estratégico no limite inferior de equilíbrio, quando consideradas as forças e as fraquezas em relação aos seus impactos nas oportunidades e ameaças, para o enfrentamento da crise.

Para a melhoria deste indicador seria necessária, obrigatoriamente, a ampliação da capacidade ofensiva e a potencialização das áreas de domínio da Instituição.

Um dado que se mostrou preocupante foi a capacidade defensiva, uma vez que as ameaças poderiam fragilizar sobremaneira a Instituição.

Isto foi sentido logo no início da crise, quando surgiu um movimento político propondo a diminuição das mensalidades por meio da possível aprovação de projetos de lei, tanto na Assembleia do Estado como na Câmara dos Deputados.

A Instituição precisou enfrentar estas possibilidades de risco e criar barreiras contra as ameaças, como, por exemplo, abrir a todos os estudantes o percentual dos custos de cada alínea do orçamento, bem como focar no tratamento das reclamações.

Este movimento político acabou gerando, como será visto mais adiante, um forte aumento da inadimplência em 30 dias, já no segundo mês de paralisação.

A análise mais apurada da matriz apontou, também, para a necessidade de correção rápida de alguns problemas internos, uma vez que as debilidades deixavam a nossa situação desconfortável.

Isto significou, por exemplo, uma atenção maior no detalhamento dos comunicados a professores e estudantes.

Prevendo um cenário desfavorável do ponto de vista econômico, decidiu-se pela interrupção dos investimentos programados e pela não captação de empréstimos bancários para efetuar o pagamento de salários.

Foi levantado o histórico de gasto com pessoal e o Comitê Gestor assumiu o compromisso de dedicar 60% das receitas para esta finalidade, independentemente dos índices de inadimplência.

Após essas definições, todos os professores e funcionários foram informados sobre a possibilidade da ocorrência de variações salariais pela possível perda de receitas e, caso isto se concretizasse, seriam utilizados os dados históricos para garantir a proporcionalidade.

Esta comunicação auxiliou na conscientização de professores e funcionários de que seus salários estavam estreitamente vinculados ao grau de satisfação dos estudantes, refletido no pagamento das mensalidades.

Com certeza, caso ocorresse, essa não seria uma situação confortável, mas era o sacrifício coletivo necessário, uma vez que foi decidido também que ninguém seria demitido.

No comunicado, houve uma sugestão de cautela na programação de gastos e assunção de dívidas pessoais.

 

3. A INADIMPLÊNCIA.

A inadimplência é uma velha companheira das instituições de ensino, necessitando de gerenciamento constantemente.

Há três anos foi organizado no Pentágono um setor específico de crédito e cobrança e, desde o ano de 2019, foi iniciado um trabalho com cronogramas e procedimentos sistematizados definidos pelo Comitê Gestor e oficializado na forma de Procedimento Operacional Padrão (POP).

A Instituição tem utilizado o sistema acadêmico como apoio à prevenção da inadimplência, bem como ações cotidianas de cobrança, ciente é claro de que ainda haverá sempre espaço para melhorias.

Possuía um seguro contratado com uma das maiores seguradoras do mercado, a fim de cobrir situações de perda de renda do responsável financeiro e para situações de desemprego que possam impactar o pagamento das mensalidades.

Foi feita a opção por este sistema, sobretudo em razão da análise do perfil dos nossos estudantes.

Em situações de sinistro, achávamos que bastaria comunicar a instituição financeira e enviar a documentação exigida.

Entretanto, quando surgiu a crise, para nossa surpresa, foi verificada a existência de uma cláusula específica nos contratos (que achamos que nunca seria usada) que impede o acionamento do seguro em casos de guerra, desastres naturais e pandemia.

Portanto, este seguro não poderia, infelizmente, ser utilizado.

Em razão disso, realizamos um levantamento dos valores pagos à seguradora e confrontamos com o recebido até aquela data, cuja análise identificou uma situação financeiramente desfavorável para nossa Instituição.

Ficou decidido que seria revista a necessidade ou conveniência de manter o seguro e suas condições.

Na prática, nesse momento, a solução do uso do seguro para atenuar a inadimplência premente verificou-se inviável.

Nosso monitoramento dos índices de inadimplência é baseado em cinco pontos de medição: no mês corrente, em 30, 60, 90 dias e ao final do ano.

Quando o Comitê Gestor se reúne toda segunda-feira pela manhã, estes dados são apresentados, analisados e comparados.

A inadimplência de 30 dias possui um impacto nos compromissos de curto prazo, afetando diretamente o fluxo de caixa da Instituição e, por esta razão, vamos aprofundar sua análise no gráfico da Figura 2.

 

Figura 2: Gráfico comparativo da inadimplência de 30 dias - 2019/2020.


Fonte: 
Faculdade Pentágono - FAPEN.

 

No início do período letivo, os dados eram mais favoráveis quando comparados ao mesmo período do ano anterior, ou seja, os resultados eram promissores para 2020.

Entretanto, de fevereiro para março foi observado um processo crescente da inadimplência de 30 dias, tendo seu pico de 18,99% alcançado entre 4 e 8 de maio.

Posteriormente, houve uma queda e no mês de junho o índice praticamente recuperou-se, mantendo o patamar do ano de 2019.

A ação da equipe de cobrança, na manutenção rigorosa dos procedimentos anteriormente descritos na forma de POP, juntamente com a rápida resposta à comunidade no detalhamento do orçamento, justificando e demostrando a impossibilidade na concessão de descontos, geraram os resultados demonstrados no gráfico da Figura 2, o que foi considerado como demonstração do sucesso das estratégias gerais que já vínhamos adotamos.

Uma forte hipótese é que este crescimento da inadimplência de 30 dias esteja vinculado, sobretudo, à expectativa dos estudantes em receber descontos nas mensalidades.

Foi neste período que alguns políticos apresentaram projetos de lei, já mencionados, para que as instituições de ensino fossem obrigadas a conceder descontos nas mensalidades.

Isto pode ser observado pelo monitoramento das reclamações na forma de e-mails ou manifestações nas redes sociais.

Um fato como este revela o risco de certas notícias prematuras gerarem crises desnecessárias no setor de serviços.

 

4. A EVASÃO.

Do ponto de vista da evasão, foram observadas duas situações distintas: no ensino básico, embora tenha havido um número significativo de reclamações, não houve grande impacto no comportamento das transferências, conforme apontam os números da Tabela 1.

 

Tabela 1: Evasão no nosso Ensino Básico e Superior - 2019 /2020.


Fonte:
 Colégio e Faculdade Pentágono.


Um aspecto a ser observado como positivo foi a estabilidade - em cerca de 1,5%  -  da evasão no ensino básico.

Logo que surgiram as primeiras solicitações de descontos, com a alegação de que nossas despesas operacionais estavam mais aliviadas pela ausência dos estudantes no campus, preparamos uma comunicação a todos os responsáveis financeiros, detalhando a composição orçamentária da instituição.

Paralelamente, à medida em que sofríamos críticas nas redes sociais, fomos nos posicionando e, com isto, as reclamações caíram paulatinamente.

É possível inferir que o baixo índice de evasão neste segmento, com um quadro mais favorável a este ano de pandemia, esteja vinculado, além da pronta resposta às reclamações, às dificuldades de mobilidade estudantil; em função do fechamento das escolas e ainda ao fato de os competidores não ofereceram soluções ou alternativas que viessem a seduzir os nossos estudantes para uma transferência.

No ensino superior, a evasão observada no mesmo período praticamente dobrou, passando de 4,9% para 9,3%. Houve um aumento da evasão em todos os cursos oferecidos pela Instituição.

Este aumento significativo, nos índices de evasão, pode indicar, na análise feita pelo Comitê Gestor, um adiamento no projeto de ensino superior do estudante ou ainda um questionamento sobre suas prioridades.

Outra questão determinante é o fato de o próprio estudante assumir os custos com sua formação e, ainda, muitos trabalharem de forma autônoma; tendo muitos destes, em razão da pandemia, perdido suas fontes de renda.

 

Figura 3: Motivação declarada pelos estudantes do ensino superior para a evasão - 2019 /2020.


Fonte:
 Faculdade Pentágono - FAPEN.

 

Como havíamos previsto no SWOT, quando analisadas as causas da evasão declaradas pelos alunos, houve um aumento considerável da evasão motivada por problemas financeiros; passando de 19,0% em 2019 para 42,7% em 2020, índices apontados na tabela anterior, conforme Figura 3.

 

5. AS PREOCUPAÇÕES COM A APRENDIZAGEM.

Com os estudantes impedidos de desenvolver atividades presenciais, a partir de março, a Instituição aumentou seu foco na busca de alternativas para o atendimento às necessidades impostas pelo planejamento acadêmico do período letivo; discutindo, testando e implementando metodologias de ensino que, em curto espaço de tempo, tinham que ser disponibilizadas aos estudantes.

Foram fornecidas aulas virtuais e orientação aos estudos em casa.

Entretanto, a Instituição não dispõe de mecanismos que possa garantir, com precisão, a eficácia do trabalho desenvolvido, considerando que a maioria dos estudantes e professores não possui experiência com educação à distância e que existem dificuldades de acesso à tecnologia em muitas casas.

Como apontam Harris e Larsen (s.d), além dos desafios educacionais, nos deparamos também com problemas mais amplos para os estudantes e o entorno de suas famílias, incluindo a crise econômica, perda ou diminuição de renda e a ameaça à saúde.

Em resumo, o tempo prolongado de isolamento, possivelmente afetou e afetará de maneira negativa o desempenho dos estudantes e esse impacto será difícil dimensionar.

Ficou decidido que haveria a realização de um levantamento com os estudantes do ensino superior no mês de junho, com o objetivo de verificar suas percepções e sentimentos com relação a algumas questões que precisariam ser respondidas no retorno das atividades presenciais.

Foi organizado um questionário em formato digital e as respostas dos estudantes foram feitas online.

Os resultados estão resumidos na Figura 4.

 

Figura 4: Resumo de percepções e sentimentos dos estudantes do ensino superior sobre as atividades durante a pandemia até junho de 2020.


Fonte:
 Faculdade Pentágono - FAPEN.

 

A Figura 4 mostra que se confirmaram as suspeitas iniciais.

Antes, porém, é importante destacar o reconhecimento dos estudantes com relação ao engajamento do corpo docente (100% de percepção positiva), cuja importância havia sido detectada na análise SWOT.

Positivo também é o reconhecimento de que, mesmo à distância, os alunos sentiram que sua carga de estudos aumentou.

Os resultados apontam, entretanto, que praticamente dois terços dos estudantes sinalizaram que sentiram perdas de aprendizagem e esta questão se apresenta como crítica, até porque há pouco histórico de monitoramento para concluir qual o percentual de perda que esta situação pode gerar para o desempenho adequado do corpo discente.

Junto com a equipe acadêmica, já havia sido levantado que essa situação impactaria em perdas e atrasos educacionais não somente neste ano, mas também em anos futuros.

Embora as interrupções decorrentes da pandemia não tenham precedentes, há algumas pesquisas existentes sobre os impactos da falta da escola devido ao absenteísmo, férias de meio de ano e encerramentos de período letivo que podem fornecer algumas pistas e dar condições de projetarmos possíveis perdas de aprendizagem devido a essa situação.

Pesquisas anteriores sobre o tempo em que os alunos passam fora da escola são úteis, dada à importância de se prever o impacto da pandemia no desempenho de curto e longo prazo.

Segundo o National Bureau of Economic Research of Massachusetts (GOODMAN, 2014), o estudante americano médio fica ausente por mais de duas semanas em cada ano escolar devido à queda de neve.

De acordo com as pesquisas de Joshua Goodman, (2014), cada ausência induzida pelo mau tempo reduz o aprendizado de matemática em 5%.

Após discussão com as coordenações, foi decidido que todo o planejamento para o segundo semestre e para o ano de 2021 precisará ser revisto.

Para tentar estimar as perdas, foi realizada, na segunda quinzena de junho, uma matriz avaliativa, em que os professores elaboraram uma avaliação diagnóstica abrangendo os conceitos básicos, essenciais e acessórios de suas disciplinas, tendo como referência o plano de ensino.

Estes resultados subsidiarão o replanejamento para a recuperação das perdas acadêmicas.

Outro ponto que chamou a atenção, no levantamento com os estudantes, foi o fato de 32,5% não se declararem aptos emocionalmente para a crise.

O isolamento dos estudantes, causado pela pandemia possui aspectos adicionais de trauma para como a perda de recursos e de oportunidade de aprendizado que vão muito além do que podemos monitorar.

Os estudantes com recursos financeiros, empregos estáveis e flexibilidade no trabalho; certamente terão mais facilidade do que aqueles que pagam aluguel, trabalham de forma autônoma, com redução de salários e mais afetados pela situação econômica.

Recentemente, a ONG americana Education Trust (2020) realizou uma pesquisa com os pais de estudantes da Califórnia e de Nova York e descobriu que níveis elevados de estresse para famílias (pais e filhos) devem continuar por um tempo, ainda indefinido; devido à incerteza econômica e à perda de emprego, temores com relação ao vírus, com risco de vida e o impacto psicológico dos problemas sociais, isolamento e perturbações da vida cotidiana.

Pesquisas sugerem que o impacto das interrupções escolares após desastres naturais no desenvolvimento do aluno foi duradouro, com alguns deles continuando a mostrar sofrimento psicológico e problemas de concentração por vários anos ainda.

Fato demonstrado no trabalho desenvolvido por Jacqui Duncan (2016) para a Canterbury Primary Principals' Association, sobre os efeitos do terremoto ocorrido na Nova Zelândia em 2016.

Há que se destacar também o alto grau de reconhecimento pelos educandos de suas dificuldades em administrar o tempo (89,2%), competência que as escolas precisam se empenhar em desenvolver em seus alunos, tanto para sua vida pessoal e profissional.

A falta dos colegas (88,5%) sentida pela grande maioria dos alunos pesquisados é um demonstrativo de que o ensino virtual jamais substituirá a necessária experiência de convivência social, entre os alunos e desses com os professores, por mais que se valorize e se possa usar bem as ferramentas de ensino a distancia.

A geração da internet se ressente, mesmo ela, da convivência com colegas e professores, decorrente da presença física nas escolas e de aulas práticas (56,5%) que exigem sua presença na Instituição.

A crise da pandemia também deixou claro que as atividades de educação a distância precisam ser incorporadas e aprimoradas, de modo a fazerem parte do cotidiano dos alunos, na sua melhor forma e com todo o seu potencial, complementando ou substituindo com qualidade e sempre que necessário e desejável, parte das atividades presenciais.

 

6. A PREPARAÇÃO PARA O RETORNO.

Mesmo que os estudos, até agora desenvolvidos, apontem para impactos potenciais na vida e na aprendizagem dos alunos (com base em diferentes suposições feitas sobre a situação atual); pensar em como lidar com o problema pode auxiliar na formulação de estratégias e ações para o acolhimento dos estudantes no retorno às atividades presenciais.

É possível que o retorno das atividades presenciais necessite de um escalonamento para evitar aglomerações e, consequentemente, diminuir os riscos de contaminação.

Caso esta situação se configure, considerando que dois terços dos estudantes declararam ter tido perda de aprendizagem (conforme demonstrado na Figura 4), daremos preferência ao retorno presencial deste grupo, como também daqueles que apresentaram dificuldade de acesso por falta de recursos tecnológicos.

A alternativa do escalonamento está sendo discutida em diversas instituições.

O Massachusetts Institute of Technology (2020), em seu MIT News Office de 17 de junho, após analisar várias opções - indo desde a presença de todos os estudantes de graduação no campus a um curso totalmente online -, sinalizou que o retorno deveria ser escalonado.

Considerando o aspecto de biossegurança, foi estruturada uma equipe que se encarregou de preparar um documento denominado Plano de Retorno das Atividades Presenciais, cujo lema é: “A sua saúde depende dos meus hábitos e a minha depende dos seus”.

Este documento, organizado na forma de protocolos, tem por objetivo sinalizar ações sanitárias preventivas e incentivar mudanças de hábitos sociais que possam baixar os riscos de contaminação e evitar a disseminação do vírus entre estudantes, funcionários, colaboradores, prestadores de serviços e parceiros.

Quanto aos aspectos acadêmicos, em discussão com toda a equipe de coordenação, foram considerados cinco pontos importantes para que os impactos desta parada compulsória possam ser atenuados neste e nos próximos anos:

 

Primeiro:

Os docentes, expondo sua privacidade, transferiram parte do ambiente da aula para suas casas, muito embora alguns não possuíssem recursos tecnológicos adequados, bem como experiência em instruções online.

Este conjunto, vinculado às novas demandas surgidas pela direção, coordenação e estudantes, pode ter afetado emocionalmente o professor.

Portanto, é de suma importância proporcionar oportunidades de apoio psicoemocional prévio, respaldando os docentes para a retomada dos trabalhos presenciais.

 

Segundo:

A partir da premissa de que haverá perdas e atrasos substanciais de aprendizagem, será necessário, na medida do possível, garantir que os estudantes assimilem os conceitos básicos e essenciais de cada disciplina.

Os resultados da avaliação diagnóstica são essenciais para que, coordenadores e professores, tenham em mãos informações suficientes para discutir como será o replanejamento para os dois próximos anos.

 

Terceiro:

É provável que os estudantes retornem com diferenças mais acentuadas em suas habilidades acadêmicas do que em circunstâncias normais, de acordo com o estudo de Harris e Larsen (2014).

Percebemos também, em nossas capacitações e discussões com os professores, a dificuldade de boa parte do corpo docente em trabalhar com turmas heterogêneas.

O que possivelmente afetará a capacidade de alguns em se adaptar e às suas aulas para atender às necessidades dos estudantes.

Portanto, será preciso considerar a necessidade de preparar os professores e discutir alternativas de aprendizagem individualizada.

 

Quarto:

Historicamente - segundo Cooper, Charlton, Lindsay e Greathouse (1996) -, há perdas escolares no retorno das férias dos estudantes.

No entanto, o que os alunos terão que recuperar, após o retorno às atividades presencias, provavelmente será maior devido à crise da pandemia.

Será importante criar situações com os estudantes para determinar as taxas de crescimento necessárias, visando alcançar e estabelecer metas de aprendizado para o restante deste ano.

Nestas ações, deverão ser incluídas alternativas de apoio à aprendizagem para os alunos mais afetados pelo fechamento temporário da Instituição, com a utilização dos estagiários e de plataformas digitais, à semelhança das utilizadas durante a crise.

 

Quinto:

A Instituição, na medida do possível, disponibilizará suporte e orientação para coordenadores e professores, para que os estudantes consigam assimilar as atividades acadêmicas remotamente.

Há uma variável também determinante no processo de aprendizagem que é o bem-estar emocional. 

A compreensão desses impactos e a melhor forma de apoiar as necessidades sociais e emocionais do corpo discente no pós-crise será essencial.

Neste sentido, será estruturado um programa de capacitação ao corpo docente para dar suporte psicoemocional a estes estudantes.

 

7. REFERÊNCIAS.

COOPER, H. et al.  The effects of summer vacation on achievement test scores: A narrative and meta-analytic review. Review of Educational Research, 66, 227-268, 1996.

DUNCAN, J. CPPA Inquiry into the Ministry of Education’s post-earthquake response for education in Christchurch, Canterbury Primary Principals Association. New Zealand, 2016.

EUA. Massachusetts Institute of Technology. MIT News Office, Massachusetts de 17 de junho de 2020.

EUA. The Education Trust. COVID-19: Impact on education equity: Resources and responses. USA, 2020. Disponível em https://edtrust.org/covid-19-impact-on-education-equityresources-responding/ Acesso em 03 de junho de 2020.

GOODMAN, J. Flaking Out: Student Absences and Snow Days as Disruptions of Instructional Time. National Bureau of Economic Research of Massachusetts, NBER Working Paper No. 20221, Massachusetts, 2014.

HARRIS, D. e LARSEN, M. The effects of the New Orleans post-Katrina market-based school reforms on medium-term student outcomes. Education Research Alliance for New Orleans. Disponível em https://educationresearchalliancenola.org/files/publications/Harris-Larsen-ReformEffects-2019-08-01.p. Acesso em 03 de junho de 2020.

ROSENTHAL, CHARLES e HART. Coping with Crises: The Management of disasters, riots and Terrorism. C.C Thomas, the University of Michigan. 1989.





[i] SWOT é a sigla formada pelas iniciais em inglês das palavras: Strengths, Weaknesses, Opportunities and Threats (Forças, Fraquezas, Oportunidades e Ameaças).